Estudar os componentes da Inteligência Emocional me fez refletir muito sobre como privilegiamos o desenvolvimento intelectual e cognitivo ao longo da infância, adolescência e vida adulta, em detrimento ao desenvolvimento de habilidades emocionais.
Penso que olhar pouco para as nossas emoções gera consequências bem dramáticas para a nossa sociedade. Ao longo da história temos muitos exemplos disso. Separei dois deles para esta reflexão. No início da década de 60, dois acontecimentos nos trouxeram à tona os limites que um homem pode ir sem que tenha intencionalidade consciente.
O primeiro foi o emblemático julgamento de Adolf Eichmann em 1961, membro do Departamento de Segurança de Hitler, responsável pelos controles dos horários de partida dos trens carregados de judeus em direção aos campos de concentração nazistas, viabilizando a “Solução Final”, um dos momentos mais repugnantes da história da humanidade. Eichman nunca matou diretamente ninguém, mas sua atividade viabilizou o extermínio de milhares de vidas.
A filósofa Hannah Arendt enxergou Eichmann com uma sensibilidade que gerou uma série de reflexões em sua obra dali em diante. A grande lição da trajetória dele, segundo Arendt, é entendermos a banalidade do mal. Diante dela no tribunal não havia um monstro, um homem mal e cruel ou um doente mental, era um homem comum, um homem banal, um fiel servidor das ordens em busca de ascensão social e de carreira.
Ele não conseguiu enxergar os fatos pela perspectiva dos outros, nem foi corajoso o suficiente para questionar as ordens que lhe eram dadas, por mais absurdas, questionáveis e sombrias que fossem. Ele apenas acatava as ordens (mesmo que imorais) e as seguia.
Como um homem comum comete atos tão repugnantes?
A inumanidade que se causa a um outro, destrói a humanidade em mim.
Immanuel Kant
Para refletir mais profundamente, vamos ao segundo momento histórico, iniciado cerca de um ano após esse evento. Em 1962, o psicólogo e pesquisador Stanley Milgram da Universidade de Yale, conduziu um experimento perturbador sobre os limites da obediência humana. Uma boa forma de conhecê-lo é assistindo ao filme “O Experimento de Milgram”, disponível no YouTube.
Ele simulou em laboratório uma situação de punição no processo de aprendizagem. Em duplas, um voluntário atuava como professor, enquanto um membro da equipe da pesquisa seria o aluno. A tarefa era simples, a memorização de duplas de palavras, cada erro gerava um choque aplicado pelo professor no aluno. A cada erro, a voltagem deveria ser aumentada chegando até o limite máximo de 450 volts (que seria doloroso como uma picada de abelha) . O voluntário no papel do professor não sabia, mas os choques não eram aplicados verdadeiramente, mas a sensação era real, pois o aluno gritava de dor, implorando para que o outro parasse.
A hipótese de Milgram era de que a grande maioria pararia nos primeiros choques aplicados, mas para sua surpresa, cerca de 65% foi até a última voltagem disponível, obedecendo a instrução do pesquisador. Alguns questionaram o comando, mas seguiram adiante, sendo que nenhum voluntário foi até a sala ao lado conferir se o outro (suposto) voluntário estava bem.
O que leva um estudante ou uma dona de casa a infringirem sofrimento a outro ser humano durante um experimento? Por que simplesmente não pararam? Por que silenciaram seu julgamento do que é certo?
Vemos cotidianamente exemplos como esse … pessoas que prejudicam outras pessoas (até no ambiente de trabalho). Será que elas refletem sobre as consequências de seus atos? Até onde uma pessoa é capaz de ir em obediência a uma figura de autoridade?
Como evitamos a obediência, o silêncio e a falta de questionamento?
Uma vida sem pensamento é totalmente possível, mas ela fracassa em fazer desabrochar sua própria essência – ela não é apenas sem sentido; ela não é totalmente viva. Homens que não pensam são como sonâmbulos.
Hannah Arendt
Seria o desenvolvimento de habilidades socioemocionais o caminho para a cura? Acho que poderia ser um bom começo.
Não vejo outro caminho senão o da ampliação da consciência. Nós humanos SEMPRE temos LIBERDADE para agirmos diferente. Entretanto, para não sermos cegos e obedientes a uma figura de autoridade precisamos de CONSCIÊNCIA. Ter uma profunda consciência de si mesmo e do outro é o caminho para o respeito, justiça e dignidade humana. Vale para o Estado, para Empresas e para a Vida.
A boa notícia e que me traz esperança é que a Inteligência Emocional pode ser desenvolvida. Sou prova viva, pois lapidei minha empatia ao longo de 15 anos de gestão de equipes. É possível sim evoluir em aspectos como: consciência emocional, autoestima, empatia, relações interpessoais, flexibilidade, dentre outros fatores que a compõe.
O primeiro passo é a coragem de enfrentar a si mesmo! Pense nisso.
Para estimular seu pensamento neste tema:
Livros
- Eichmann em Jerusalém: um relato sobre a banalidade do mal, por Hannah Arendt
- Obediência à autoridade, por Stanley Milgram
- Inteligência Emocional, por Daniel Goleman
- The EQ Edge: Emotional Intelligence and Your Success, por Steven J. Stein e Howard E. Book
Filmes:
- Hannah Arendt – Ideias que chocaram o mundo, disponível no Netflix
- O experimento de Milgram, disponível no YouTube
Conheça a ti mesmo:
Ferramenta para ampliar seu autoconhecimento em Inteligência Emocional: EQ-i 2.0 – (disponível na Fellipelli e consultores qualificados)